Paz Podre
Não está fácil o restabelecimento da normalidade.
Dir-se-ia que vivemos uma paz podre. As histórias, todas elas à roda da violência e do ódio que já assentaram arraiais, acabam por ser quase todas iguais. Aliás, na capital, em particular nos bairros mais populosos, a insegurança nunca deixou de existir, só está melhor mascarada; os apedrejamentos mantêm-se entre bandos rivais numa constante marcação de território; nos campos de acolhimento, os refugiados e os moradores da zona vivem em constante provocação. Não será exagero dizer-se que as palavras soam como arma de arremesso, retinem como espadas bem afiadas.
Quando as forças internacionais se aproximam das zonas de conflito, vive-se em fugaz e aparente normalidade mas, basta que se afastem do local para que a violência recomece. Presumo até que, a exemplo do que sucedeu no dia 28 de Abril passado aquando dos desacatos junto do Palácio do Governo e do Parlamento Nacional, os jovens talhados pela violência se vestem momentaneamente de pele de cordeiro, olhando placidamente em volta, com o olhar perdido no espaço, como se não pertencessem a este mundo.
Ontem, pela manhã, na zona exterior do hospital que alberga muitos deslocados, um estudante misto-chinês foi por eles espancado violentamente.
Outro jovem que fora esfaqueado uns dias antes em Fatuhada, próximo do mercado de Comoro, sucumbiu aos ferimentos no hospital.
Há histórias de violação de raparigas no campo de refugiados do aeroporto.
Em nome de coisa nenhuma, a violência transformou-se num entrenimento, num desporto praticado por pessoas desocupadas, de escalão etário e social variados, de entre os quais se salientam os jovens - parte deles fazendo-se transportar acelerando em veículos motorizados - prontos para dar asas à fúria que sempre fez parte da sua vida, armados de pedra na mão, portadores habituais das rama ambon, lenço atado em triângulo na cabeça, calças de ganga preferencialmente rasgadas, a manga da t-shirt bem arregaçada para que se possa imaginar algum minúsculo músculo que ao de leve se destaque dos corpos franzinos mas que – julgam eles - atemorize o adversário.
Recuando no tempo, mais concretamente aos fins dos anos 80 e princípios de 90, quando os jovens surgiram de peito aberto enfrentando as forças de ocupação, empunhando cartazes durante as visitas de diplomatas internacionais, os jovens de então foram vistos como a esperança de Timor independente. Recordo as palavras do meu amigo Adelino Gomes sobre a adivinhada brevidade da independência timorense com a determinante intervenção dos jovens, interpretando o descontentamento de quem tinha nascido justamente durante o violento período indonésio e apenas tivesse tido contacto com essa realidade como uma mais valia para a causa da independência.
Agora que somos independentes, quase apetece perguntar que objectivos perseguem os jovens de hoje que repetem até à exaustão os gestos de violência, sem se dar tempo a reflectir nos seus actos de destruição continuada.
Faltam, certamente, uma referência, uma bandeira que nos una, um objectivo comum com o qual nos sintamos todos identificados. E isso passa, obrigatoriamente, pelo esforço e participação de todos os timorenses na construção do país, pela imposição da paz, da estabilidade, da segurança. Só assim todos nos sentiremos parte da Nação timorense e só assim será possível mantermos a independência.
Dir-se-ia que vivemos uma paz podre. As histórias, todas elas à roda da violência e do ódio que já assentaram arraiais, acabam por ser quase todas iguais. Aliás, na capital, em particular nos bairros mais populosos, a insegurança nunca deixou de existir, só está melhor mascarada; os apedrejamentos mantêm-se entre bandos rivais numa constante marcação de território; nos campos de acolhimento, os refugiados e os moradores da zona vivem em constante provocação. Não será exagero dizer-se que as palavras soam como arma de arremesso, retinem como espadas bem afiadas.
Quando as forças internacionais se aproximam das zonas de conflito, vive-se em fugaz e aparente normalidade mas, basta que se afastem do local para que a violência recomece. Presumo até que, a exemplo do que sucedeu no dia 28 de Abril passado aquando dos desacatos junto do Palácio do Governo e do Parlamento Nacional, os jovens talhados pela violência se vestem momentaneamente de pele de cordeiro, olhando placidamente em volta, com o olhar perdido no espaço, como se não pertencessem a este mundo.
Ontem, pela manhã, na zona exterior do hospital que alberga muitos deslocados, um estudante misto-chinês foi por eles espancado violentamente.
Outro jovem que fora esfaqueado uns dias antes em Fatuhada, próximo do mercado de Comoro, sucumbiu aos ferimentos no hospital.
Há histórias de violação de raparigas no campo de refugiados do aeroporto.
Em nome de coisa nenhuma, a violência transformou-se num entrenimento, num desporto praticado por pessoas desocupadas, de escalão etário e social variados, de entre os quais se salientam os jovens - parte deles fazendo-se transportar acelerando em veículos motorizados - prontos para dar asas à fúria que sempre fez parte da sua vida, armados de pedra na mão, portadores habituais das rama ambon, lenço atado em triângulo na cabeça, calças de ganga preferencialmente rasgadas, a manga da t-shirt bem arregaçada para que se possa imaginar algum minúsculo músculo que ao de leve se destaque dos corpos franzinos mas que – julgam eles - atemorize o adversário.
Recuando no tempo, mais concretamente aos fins dos anos 80 e princípios de 90, quando os jovens surgiram de peito aberto enfrentando as forças de ocupação, empunhando cartazes durante as visitas de diplomatas internacionais, os jovens de então foram vistos como a esperança de Timor independente. Recordo as palavras do meu amigo Adelino Gomes sobre a adivinhada brevidade da independência timorense com a determinante intervenção dos jovens, interpretando o descontentamento de quem tinha nascido justamente durante o violento período indonésio e apenas tivesse tido contacto com essa realidade como uma mais valia para a causa da independência.
Agora que somos independentes, quase apetece perguntar que objectivos perseguem os jovens de hoje que repetem até à exaustão os gestos de violência, sem se dar tempo a reflectir nos seus actos de destruição continuada.
Faltam, certamente, uma referência, uma bandeira que nos una, um objectivo comum com o qual nos sintamos todos identificados. E isso passa, obrigatoriamente, pelo esforço e participação de todos os timorenses na construção do país, pela imposição da paz, da estabilidade, da segurança. Só assim todos nos sentiremos parte da Nação timorense e só assim será possível mantermos a independência.