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segunda-feira, julho 24, 2006 

Notas soltas


Em Díli, mais propriamente na zona de Comoro, o tal bairro complicado da cidade, todos os dias se verificam apedrejamentos entre dois grupos distintos.
Do lado de baixo da rua, no sentido do mar, e próximo do Mercado, o bairro pertence à aldeia da Praia dos Coqueiros que começa justo na praia; os mais novos que nasceram no tempo indonésio ainda se lhe referem como o “Pantai Kelapa”, onde a maioria da população é de Lorosa´e. Do lado de cima da rua, do lado das montanhas onde vivem os de Loromonu começa o bairro de “Ai Mutin”, o das árvores brancas.
São visíveis as pedras que jazem no meio e na berma da via recolhidas e atiradas por jovens que parece que andam numa contínua demarcação de território. As tropas fazem a sua aparição e impõem respeito momentaneamente mas, daí a pouco, recomeça a batalha.
A alternativa para quem vai ao centro da cidade é ir pela marginal. Se bem que, junto à Praia dos Coqueiros, logo na curva da Pertamina, no início da Avenida de Portugal, haja agora mais movimento com o aparecimento de um mercado. Precisamente onde mora o administrador da cidade, todos os dias aumenta o tamanho do bazar com o acrescento de bancas e limpeza do terreno circundante por quem chega todos os dias e já transformou a zona em dormitório. Aí comem e dormem. As condições são precárias e a degradação consequente do ambiente e a falta de higiene é uma evidência gritante. Falam quase todos makassae, um dos dialectos de leste.
Comenta quem vê que aí pode estar outro viveiro de problemas…

E por falar de viveiro de problemas, a acrescentar a estes que o conflito ampliou, um forasteiro fez a sua aparição triunfal na capital e vai criar problemas sérios na fauna e na flora. Veio para ficar. Dá-se menos por ele, mas sabe-se da sua perigosidade. Há anos que andava pelas montanhas e o seu veneno mata qualquer animal quando se sente atacado. É estrangeiro e foi introduzido em Timor, vindo agarrado ao fundo dos tanques militares em 1999. É feio, tem pele grossa, escamada, de um castanho-esverdeado. Coaxa como as rãs normais. Mas é um sapo nojento e já anda descaradamente pelos tanques domésticos como se tudo lhe pertencesse!
Em inglês, chamam cane toad ao bicho que foi importado da América Latina para a Austrália com o objectivo de acabar com a doença da cana-de-açúcar provocado por outra qualquer bicheza. Como se esqueceram de importar o predador, o tal cane toad multiplicou-se e tomou conta de grande área australiana, onde também constitui um sério problema ambiental. Em Timor, chamam-lhe Interfet.
Mas aqui na minha rua, apesar dos Interfet, reina a calmaria. Percebe-se isso não só pelo movimento de passeantes para a igreja, de alguns postos de venda de legumes mas especialmente por uma cena apenas possível quando há tranquilidade.
Sentada sobre um tijolo a fazer de banco, uma senhora de costas voltadas para a rua, de cabeça baixa, olhos no chão, em pose de descontracção total deixava que o seu farto cabelo fosse criteriosamente manuseado por outra mulher mais jovem que catava, catava, catava…
Os piolhos deviam ser às centenas, a avaliar pelo tempo que demorou a operação.
Bendita Paz, santo Deus!