O 31º aniversário das FALINTIL
Não foi assim há tanto tempo em que falar-se das F-FDTL implicava naturalmente recordar o passado glorioso das forças que as antecederam, as valorosas e lendárias FALINTIL!
Por coisa nenhuma, desperdiçou-se um passado de glória, de dádiva, de coragem e de entrega generosa pela nação timorense, pela pátria ocupada, humilhada, vilipendiada, sofrida. Por uma mão cheia de nada, desbaratou-se o respeito que lhes era devido por todo o povo timorense e do qual eram justamente merecedores.
Alcançada a independência, retornando à normalidade da vida de caserna, de tropa regular, esboroou-se, desapareceu como que por magia, a imagem que acompanhou os guerrilheiros na luta contra o ocupante. Perdeu-se a noção de disciplina que sempre os havia acompanhado no mato. Perdeu-se o conceito de grupo, a importância do trabalho de equipa. Enveredou-se por caminhos quiçá mais vulgares para os quais ninguém estava, percebeu-se tarde demais, preparado.
Talvez inadaptados, provavelmente desenraizados na sua terra, soçobraram a questões menores quando comparadas com a dureza da vida no mato. Talvez por terem tido finalmente a oportunidade de usufruir de bens de que se desabituaram nos longos anos de vida clandestina. Ou que nunca tenham tido, sequer! Talvez também porque ninguém tenha acompanhado, nem se tenha empenhado e trabalhado para a sua correcta reintegração na sociedade. Talvez ainda porque se tenha pensado que homens habituados a nada ter, continuassem a aceitar passivamente a tudo dar e a pouco ou nada receber.
Desfez-se o mito. Os homens quase-deuses são tão-só e apenas homens, sujeitos a fraquezas. E sendo embora um lugar comum, a verdade é que os homens erram. Erraram os homens das FALINTIL, os que integraram as Forças de Defesa de Timor-Leste bem com os que ficaram de fora, que não aguentaram continuar a ver-se rodeados de uma aura que ultrapassava a sua real dimensão.
Mas não foram só eles que erraram. Nem foram apenas eles que se deixaram levar por razões de importância menor. E também não foram só eles que se mostraram impreparados para levar a bom porto a difícil tarefa de reconstruir Timor-Leste.
É naturalmente doloroso reconhecê-lo. Mas impõe-se fazê-lo. Impõe-se exorcizar os males, compreender as razões do seu desalento, reconhecer os erros. E criar condições para que voltem a merecer o respeito e o carinho do povo a que pertencem, reabilitando a sua imagem. Porque os timorenses precisam de acreditar que existem, entre eles, seres de eleição, superiores na força moral, anímica. Para que ninguém mais se perca nem se desvaire. Para que desapareça a desconfiança e o medo que um homem fardado de F-FDTL agora transmite.
Que se salve, pois, o que puder ser salvo. E, apesar dos erros e das fraquezas, no 31º aniversário da criação das FALINTIL, parabéns FALINTIL-FDTL!
O ser humano é feito de fragilidades e são elas que justificam os seus erros. No entanto, é através desses mesmos erros que ele efectua as suas melhores aprendizagens feitas à custa dos sofrimentos causados, provocando acertos de conduta. Decidir é muitas vezes errar mas é melhor fazê-lo do que não fazer simplesmente nada. A inacção é inimiga do aperfeiçoamento, é inimiga da evolução.
O que de pior nos pode acontecer é, muitas das vezes, consequência da nossa acomodação às situações que logo que se apresentam mais favoráveis nos fazem esquecer como e onde estão os outros e achar que não vale a pena correr mais riscos. Outras vezes é o contrário. A situação mais favorável despoleta uma ganância desenfreada por mais e mais oportunidades fazendo-nos, de igual modo, esquecer tudo e todos, ultrapassando todos os limites da decência porque só vale ter sempre mais e mais. No primeiro caso explode o “casa onde não há pão todos ralham e ninguém tem razão” e no segundo “quem tudo quer tudo perde”. E assim se vão fazendo os acertos que implicam um investimento sério na educação, na saúde, na segurança social, na protecção ambiental..., sob pena de que quem sofre são sempre os mesmos ou seja aqueles que até já aprenderam a lição mas não têm como a pôr em prática.
Não esqueçamos que o ser humano tem medo... e os medos existem para serem reconhecidos e com eles avançar, tomar decisões porque o nosso maior erro é, de longe, não decidir.
20 de Agosto de 2006
Cristina Brandão Lavender
Posted by Cristina Brandão Lavender 12:20 da manhã