Díli, destino-aventura
Pois bem, ontem os de Loromonu, encheram a cidade, que passou a ser destino-aventura!
Na ponte de Comoro, a fila chega quase ao aeroporto. Os militares malaios demoram algum tempo a revistar as viaturas, em particular as camionetas, táxis e autocarros.
A meio caminho, há quem decida fazer meia volta e ir pela ribeira. É menos confortável, o caminho é mais poeirento mas, pelo menos, é um bocado mais rápido…até ao bairro Pité onde recomeça a agitação.
As bermas das ruas enchem-se de pessoas curiosas a ver passar a manifestação barulhenta e munida de cartazes sugestivos e alusivos à crise.
Nos cruzamentos de Díli, são as tropas australianas que controlam o trânsito, com os blindados atravessados bem no meio das ruas. E quem quiser passar para o outro lado da cidade, em direcção a Bidau ou à Areia Branca, terá de dar um volta incrivelmente longa. O calor da tarde aperta e é fácil perder-se a paciência com a lentidão do trânsito, num anda-pára cansativo.
Dizia-se que vinham de Baucau, lá para os lados de Lorosae (2), outros tantos manifestantes dar o seu apoio ao Primeiro-Ministro demissionário. Consta que não chegaram a Díli porque alguém os reteve em Metinaro, como medida preventiva de um hipotético conflito entre os dois grupos com interesses opostos.
Ou como a demissão da assessora do primeiro-ministro Mari Alkatiri para a Promoção da Igualdade. Ao explicar os motivos da sua saída, de entre outros pontos, Micató – nome por que é conhecida Maria Domingas Alves - apontou o facto de ter tomado parte na manifestação incluída na Rede das Mulheres de que faz parte. E, obviamente, de ter sido vista…
Isto faz lembrar os tempos sob ocupação indonésia em que as pessoas tinham receio de trocar dois dedos de conversa em público com alguém “esquisito”, porque havia sempre um “Intel” por perto.
Aqui e agora, os novos “Intel” têm outras caras e outros modos de actuação e ainda não ficámos em silêncio, mas já começámos a baixar o tom de voz… Fala-se muito mais em surdina! E os que falam alto, sabem que ficam marcados!
A sensação com que se fica, é que virámos polícias uns dos outros. Que entrámos todos na paranóia colectiva de saber quem se associa a quem, quem está do lado de quem; daqui se conclui que, efectivamente, a democratização de Timor-Leste está bem longe de ser uma realidade interiorizada. Parece que ninguém está interessado em saber que a sua liberdade termina onde começa a liberdade do vizinho…
Valha-nos ao menos o civismo com que têm decorrido as manifestações! Sem as imagens de santos e de Nossa Senhora (ai, Timor-Leste e o respeito pelo mistério, pelo inexplicável, pelas forças do além!) usadas no ano passado na manifestação da Igreja e cuja utilização se pode interpretar como forma de limitar e até evitar qualquer desvio na ordem estabelecida, ao menos que, este ano, seja o bom senso a evitar que a situação resvale para a violência…
(1), (2) - A utilização das palavras Lorosae e Loromonu foi hoje propositadamente usada porque passaram a politicamente incorrectas, havendo já quem prefira já o leste e o oeste, dos que fogem da designação que mais não era senão um marco geográfico provocando que, um dia destes estes sejam banidas definitivamente do léxico timorense. Há que relativizar a questão e reduzir o problema à sua real dimensão…