Triste efeméride!
Há um ano, no auge da crise, durante umas quantas semanas, mal punha o pé na varanda, com medo de apanhar um tiro de uma qualquer bala perdida que ouvia silvar bem perto de minha casa … Havia homens armados na colina que daqui se divisa e, do outro lado, ali para os lados de Rai Kotuk, havia outros tantos...
As ruas estavam completamente desertas, entregues a grupos de vândalos que se compraziam em queimar, destruir, assustar.
Os moradores das casas vizinhas haviam partido. Quem pôde, regressou à sua montanha ansioso de encontrar refúgio seguro.
Ficaram dois. Levei algum tempo a convencer D. a não se fazer à estrada. Parecia uma conversa de surdos. Cada qual a procurar baldadamente convencer o outro.
- Tenho de ir por causa dos meus filhos…
- E se o matam, que digo aos seus filhos e à sua mulher? E tu, G. , que digo aos teus pais? -retorquia eu.
Reticente, dizia D. “senhora, eu sou de Loromonu! Tenho medo!”.
E eu “D., e então eu que sou Lorosae, filha de mãe firaku e nasci em Loromonu, que acha que vai acontecer-me? Irão cortar-me ao meio? Não fugi!!!”
D. deve ter-se sentido condoído de mim pela minha natureza mestiça, makerek… mestiça malai-oan, makerek firaku-oan… e não mais falou em partir.
O perigo era real e nós sabíamo-lo mas, para além de não querermos deixar a casa não podíamos abandonar aqueles dois homens leais.
Por essa altura, qualquer coluna de fumo negro, um silvo agudo, um estampido, o silêncio prolongado, tudo provocava calafrios e obrigava a telefonemas ou SMS para familiares e amigos.
Numa das manhãs em que o perigo se abeirou ainda mais da nossa porta, quando uns tiros se fizeram ouvir bem mais próximo de nós e gente armada corria em tropel rua acima, bem rente aos muros, resolvi pedir ajuda à PNTL; telefonei ao Carlos, elemento da Polícia de Intervenção.
Carlos não pôde ajudar-me. E mal teve tempo para me dizer num tom de voz grave: tia, nós também estamos debaixo de fogo!
Umas horas depois, soube que onze agentes da polícia haviam sido assassinados no meio da rua.
Carlos salvou-se. Foi evacuado para Darwin, com ambas as pernas partidas. Receou-se que nunca mais andasse. Ainda lá se encontra em convalescença e agora já lá tem a Dora que, depois do nascimento da 2ª filha, foi ter com ele.
Ainda que quisesse, não conseguiria esquecer o olhar vítreo, os corpos daqueles onze homens e mulheres indefesos, assassinados a sangue frio, jazendo na via pública no meio de muito sangue espalhado sobre o alcatrão…
Meu Deus, como foi possível?
Hoje como há um ano, a pergunta continua sem resposta.
Exm.ª Sr.ª,
Para conhecimento e eventual divulgação junto envio dados sobre o seguinte evento http://nunopoiares.blogspot.com/:
Ciclo de Conferências
Na Senda da Aplicação do Direito Internacional Público: O Caso de Timor-Leste
31 de Maio de 2007 (18h00)
Oradores convidados:
Professor Doutor HUMBERTO FLÁVIO XAVIER
Doutor em Direito, professor universitário, Director do Departamento de Direito da Universidade Moderna (Beja) e Regente da Cadeira de Direito Internacional Público I
Mestre LUÍS MANUEL ANDRÉ ELIAS
Professor universitário, Oficial Superior de Polícia e mestre em Ciência Política pelo Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade Técnica de Lisboa. Desempenhou as funções de 2.º Comandante da Polícia das Nações Unidas entre Janeiro de 2002 e Agosto de 2003 em Timor-Leste. É autor da Obra A Formação das Polícias nos Estados Pós-Conflito: O Caso de Timor-Leste (Edições Almedina e Instituto Diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros, 2006).
Local: Universidade Moderna (Beja)
Coordenação Mestre NUNO POIARES
Posted by Nuno Poiares 7:57 da tarde
Este comentário foi removido pelo autor.
Posted by Nuno Poiares 7:59 da tarde
Que lindo texto Ângela. Também me deu para recordar a tua e a minha terra...Timor. Espero lá voltar um dia para rever gente amiga e recordar com muito carinho os nossos compatriotas tão mal e jocosamente tratados (felizmente) apenas por alguns .Abraços a toda a tua família e amigos
Daniel Braga
Posted by Daniel Braga 10:02 da tarde