quarta-feira, abril 30, 2008 

A mulher de Salsinha

Entregaram-se Salsinha e os seus homens.
Disse o Presidente da República mais ou menos isto “todos vós tendes família, mulher, filhos... “
...E os olhos da mulher mostraram-se brilhantes de lágrimas...
Entrara com o grupo e posicionou-se na segunda fila naquela sala como em segundo plano na Vida, uma senhora magra, de ar frágil, olhar triste, perdido, sofrido, olhando para dentro de si talvez questionando-se intimamente sobre o futuro incerto que a espera e a seus filhos. Má sorte!
Era a mulher de Gastão Salsinha.

domingo, abril 27, 2008 

Da falta do arroz

No tempo dos portugueses, a base da alimentação dos timorenses era o milho. Também se comia arroz mas, particularmente nas montanhas, era o milho – a par da mandioca, do inhame, da batata doce - que constituía a parte de leão da dieta dos timorenses.
Com a entrada da Indonésia e a vinda de muitos indonésios - de quem efectivamente o arroz é o prato forte -, e a distribuição do arroz aos funcionários públicos, o milho quase desapareceu da mesa dos timorenses.
Reinam o arroz e o supermie, a massa instantânea. Ao “mata-bicho”, ao almoço, ao jantar…
Sinal dos tempos é que em mesa mais ou menos farta das festas dos timorenses, a par de iguarias de carne ou peixe, abundam as versões de arroz branco, eto fila (arroz salteado em cebola bem frita), arroz de açafrão ou arroz “fugado” (que é como por aqui se chama ao arroz de tomate) ou catupa (arroz de coco cozido em cestas de folhas de palmeira). Mas, do batarda´an, prato de milho, verde ou seco, pilado ou inteiro, confeccionado com papaia verde, amendoim, leite de coco e, na versão mais rica, com carne de porco e chouriço (tipo cachupa de Cabo Verde), nem vê-lo.. ou vê-lo pouco, discretamente... Salvo raras excepções! É que se espalhou a falsa ideia de que o milho é prato de gente atrasada pelo que timorense que queira parecer evoluído, “fino”, dele desdenha, pelo menos em público…
Curioso é o facto de que são os timorenses que regressaram ao país depois da independência após anos vividos no estrangeiro que, atrevidamente, comem, apreciam, saboreiam tanto a versão pobre como a rica do batarda´an, quantas vezes sob olhar atento, curioso por vezes, , outras tantas depreciativo, em desdém pelo menos aparente, dos que se habituaram ao arroz e sem ele se sentem com peixe fora de água.
Disto se fala entre timorenses, assumido que está – entre os que nunca saíram e os que voltaram ao país - o facto de que todos nos deixámos arrastar pela moda, pela aceitação da supremacia do arroz. Disto e de como os tempos mudaram. No tempo português, a produção de arroz em Timor era suficiente para os gastos da população e o governo provincial considerava mesmo a hipótese de se exportar o produto.
No indonésio, diz-se que a importação anual rondava as seis mil toneladas. Hoje, passámos para a importação em quantidades da ordem das dezenas de milhar de toneladas.
A escassez do produto no mercado mundial e o consequente aumento de preço do arroz deixam adivinhar dificuldades nos tempos mais próximos.
Ao deixar de fazer parte da actual dieta alimentar dos timorenses, a população quase deixou de cultivar milho, pelo que não se põe sequer a ideia de que o milho possa suprir as faltas do arroz no mercado.
É urgente e fundamental que se reeduque a população convencendo-a de que o milho é bem mais substancial que o arroz. E, para fazer frente às dificuldades que aí vêm, é tarefa inadiável incentivar o plantio do milho.
Antes que seja tarde demais…

quinta-feira, abril 17, 2008 

17 de Abril


O dia em que Ramos Horta voltou ao seu país, coincide com o do 9º aniversário do massacre de Díli. Na casa do meu irmão Manuel, foram assassinados dezenas de refugiados que ali haviam procurado guarida. De entre eles, o meu sobrinho Manelito.
Quando muito se fala de se fazer Justiça como caminho necessário para o apaziguamento social ao qual não é estranho o perdão das vítimas ou das suas famílias, somos surpreendidos pela decisão indonésia de ilibar Eurico Guterres, o líder das mílicias Aitarak, mandante do massacre de 17 de Abril de 1999...
Não sei se se fará um dia Justiça. Quero acreditar que sim. Pelo Manelito, pelas dezenas de mortos sem nome nem rosto atirados para o poço da Rua Dr. António de Carvalho e por aqueles que jazem em Maubara. Não são treze como dizia a Indonésia. Porque, se eram 120 refugiados e notícia de sobreviventes só os há de 40, onde páram os outros?