terça-feira, outubro 30, 2007 

Santa paciência!

Não é nada de novo e já devíamos estar - mas não temos de estar! - habituados às falhas de energia eléctrica que nos têm acompanhado horas a fio desde os primeiros dias da independência.
Primeiro, eram os geradores do tempo da Indonésia. De tão velhos, esperava-se que os cortes de energia terminassem com as novas e poderosas máquinas, creio que oferecidas pela Noruega.
A certeza era tão grande que o então Primeiro-Ministro, Mari Alkatiri, vaticinou o museu como destino dos geradores de particulares, pondo fim à sua cantilena barulhenta. Vieram os potentes geradores, novinhos em folha e a situação melhorou ligeiramente – querendo com isso dizer que a energia faltava uma ou duas horas em vez das seis, sete, dez ou 20 horas seguidas – mas, daí a algum tempo e não tendo sido por falta de museu, os geradores de particulares continuaram sendo necessários, não obstante a presença na gestão da EDTL de técnicos da CEM, a Companhia de Electricidade de Macau.
Findo o contrato com a empresa de Macau,
chegou a vez da empresa canadiana Manitoba Hydro mostrar o que vale.
Desde o dia 1 de Setembro de 2007 que a Manitoba
gere a produção, a transmissão, a distribuição e a comercialização de energia eléctrica.

Não consta que em Macau ou no Canadá falte energia eléctrica, o que não quer dizer que a eficiência macaense e canadiana tivesse funcionado em Timor-Leste.
Um semanário local fala de um “Caso da contaminação de água e gasóleo” e remete para as declarações de um deputado que foi da bancada da FRETILIN na 1ª legislatura mas agora é
do CNRT, que “exige ao Governo que este efectue de novo uma investigação à Companhia Tafui Oil, ou mesmo, caso o justifique, cancelar o recontrato por razões que têm a ver com o problema da contaminação de água e gasóleo no tanque da máquina de Electricidade de Comoro, detectado alguns meses atrás.”
Segundo o deputado, há fortes indícios de que a Timor Oil seja a principal responsável, e que ”... técnícos... declararam na altura que existiam não somente 50 toneladas de gasóleo contaminado com água como também o tanque do Tafui Oil apresentava sinais de poluição... uma outra investigação a cargo do então Secretário do Estado de Água e Saneamento, na qual se confirmou igualmente a infiltração de água contaminada no barco de transporte do gasóleo da Companhia Tafui.”
No noticiário da TVTL transmitido ontem à noite, ficámos a saber da falta de “um parafuso” e que até à chegada de técnicos de manutenção vindos da Austrália, continuaremos sem energia, até fins de Novembro ...
Igual opinião tem o responsável da empresa canadiana. Até porque os quatro geradores a ser comprados este ano serão para permitir a manutenção dos que estão a funcionar agora e que durante cinco anos não tiveram manutenção.
Perante este quadro, a quem pedir responsabilidades? Que se passa na EDTL?
É urgente arrumar a casa, investigar, saber o que está e por que está mal!



segunda-feira, outubro 29, 2007 

Os heróis nunca morrem!


Sob o manto da noite quente e húmida, o outro lado de Vicente Reis que não é Vicente mas sim Manuel Escorial esgueirou-se mato adentro, sabendo-se que a poderosa montanha, mãe e pai do imaginário timorense vai abraçar o filho acossado.
Um dia, a Montanha se cobrirá de nevoeiro que se espalhará por todo o Mundo. E em manhã de nevoreiro surgirá El Rei D. Sebastião; e reentrarão na Vida todos os mortos-vivos que partiram, de quem não se viu o corpo inerte nem frio, dos que sobrevivem nas entranhas do Ramelau ou de Matebian, no cocoruto da montanha, numa gruta, num qualquer recôndito penhasco de Timor-Leste, nas profundezas do Mar, nas águas tingidas de sangue de Taci Tolu ou de Maubara ou mesmo, em qualquer campa rasa aberta, fechada, sem ritos, sem choro, esquecida por esses sítios onde andaram homens e mulheres a lutar por Timor...
Crêem e querem as gentes que os heróis, os seus heróis, nunca morram!

sábado, outubro 27, 2007 

O espanto da morte


Um último suspiro, um derradeiro olhar à sua volta… e a velha senhora deixou este lado da Vida rodeada dos dez filhos, dos mais de trinta netos e de outros tantos bisnetos.
O corpo desceu à terra entre prantos de dor e as recordações de uma vida debitadas em tom angustiado, chorado, gritado.
A sepultura encheu-se de flores molhadas de lágrimas e a alma partiu iluminada pelas velas que cada um deixou para lhe clarear o caminho distante até à outra Vida.
Na campa ainda sem laje, a saudade surge vestida primeiro de flores amargas, depois de flores doces e velas, sempre velas, não vá alma perder-se no caminho…
…Passou um ano. Justo tempo em que a amada matebian(1) percorreu o longo percurso até chegar ao destino. Até ao encontro marcado com Maromak (2) no além onde a esperavam aqueles que tendo partido antes dela a acompanharam no início da estrada suavizando-lhe a saída da vida terrena.
É ora tempo de kore metan, o desluto. Missa cantada. Mais recordações em choro sentido e sonoro. As vestes negras deixadas na campa marmoreada agora arranjada ao pormenor marcam o fim do luto. Flores, pétalas soltas, velas em sepultura embelezada são a evidência dos pecados expiados, da alma pacificada, da certeza de que ela chegou ao outro lado.
A grande família prepara-se, uma vez mais, para agradecer a generosidade dos que a acompanharam durante o ano da viagem.
A família fica bem. Ultrapassou a dor. Tudo agora é mais suave. A vida retorna à normalidade.
Já não se chora. Em fila disciplinada os convivas preparam-se para o banquete. Come-se, bebe-se, ecoam os risos, soltam-se as conversas.
E dança-se.
A morte já não mora, por agora, ali.
E Mãe Sedaliza repousa agora em paz!

(1) espírito, alma

(2) Deus

terça-feira, outubro 23, 2007 

Imagens de Timor-Leste

O Hospital Nacional Guido Valadares está em obras. Fiquei a saber que, para além das obras de melhoramento, o hospital vai ser ampliado no próximo ano.
Os refugiados continuam a usar como casa as varandas e as áreas destinadas a jardim. Fora do edifício, onde havia um parque automóvel, o espaço transformou-se e está cheio de pequenas casas de madeira. Há lojas de roupas, mini-mercearias e bancas de legumes entre as “casas” dos refugiados daquele aldeamento.
A chuva só deverá cair a sério a seguir ao dia de Finados. E a propósito da falta de chuva, conta um enfermeiro do tempo português que algumas doenças próprias deste tempo quente e húmido levam ao hospital dezenas de pessoas, complicando a gestão do espaço destinado aos doentes.
Pobre, com a cal da parede quase inexistente, tomadas eléctricas coladas com fita adesiva, o oratório a Nossa Senhora em frente do qual todos se benzem, o hospital está, contudo, mais organizado e mantém-se limpo; o pessoal hospitalar veste-se de novo. Os enfermeiros e os médicos timorenses vestem-se de branco; os estrangeiros de bata verde. Os outros funcionários timorenses trajam de azul.
Também se vêem mais funcionários timorenses. Comento a constatação e alguém me elucida que “a situação está mais calma”.
Na enfermaria, próximo dos serviços de emergência, inúmeros familiares – como, aliás, é norma em Timor-Leste, até mesmo quando o doente fica internado – acompanham o seu doente enquanto esperam pelos resultados médicos. Trazem-lhe água, limpam-lhe o suor do rosto, espreitam atentos a embalagem do soro, vão buscar os medicamentos à farmácia do hospital e não perdem pitada do discurso do médico ou do enfermeiro de serviço.
Reparo numa criança magrita, de cabelos lisos escorridos, olhar vivo, bonita como são todas as crianças, percorrendo o corredor para trás e para a frente, silenciosa, olhando de vez em quando em direcção à mãe que fazia companhia a um familiar mas aguentando estoicamente o longo tempo de espera.
Algumas horas depois de espera, já os adultos - também eles cansados mantendo embora aquele ar de necessária paciência! - suspiravam por um café, um copo de água quando uma senhora acompanhante mete conversa com a menina. E lá consegue ouvir muito baixo, em surdina não fosse preocupar a mãe ou incomodar os doentes: tenho fome!

***

A situação está mais calma mas ainda andam loucos à solta; dos que, na cidade e quando a noite vai adiantada, continuam a ameaçar os mais pacíficos e comuns dos mortais com rama ambong. De outros loucos que, nalgumas zonas da montanha, se vestem ou se pintam de negro, enquanto esperam pela hora do ataque a algum viajante noctívago e incauto que se faça à estrada e seja obrigado a retirar da via o tronco de árvore...
Nem sempre resulta, mas nem bandidos nem
loucos desistem!


***

Da varanda da casa com chão de cimento, em pose que pretende ser a de um homem em paz com a sua consciência, Manuel Escorial prepara-se para saborear o que parece ser uma chávena de café que uma senhora ainda jovem traz num tabuleiro.
Manuel Escorial, com um certo ar à Charles Bronson sugerido pelo bigode caindo junto das fissuras dos lábios, o tal cabelo penteado à moda antiga, magro, seco, não se alonga demais na apresentação das suas razões. Ele que é um de seis irmãos de uma família oriunda de Manatuto diz de sua justiça. Esclarece que “eu não sou Vicente Reis”, e exige a reposição do seu bom nome.
E agora que o actor principal bateu com a porta, como vai Rio da Montanha conseguir levar a água ao seu moinho?

quinta-feira, outubro 18, 2007 

Falta de atenção?

Os timorenses, tal como qualquer ser humano, precisam que lhes dêem atenção; quando a que julgam merecer é mínima ou nem sequer existe está aberto o caminho para o uso da sua prodigiosa imaginação a que não é alheio o gosto pela intervenção do sobrenatural nos vários aspectos da Vida, dos mais comezinhos aos mais complexos. Fazem-no justamente com o objectivo de conseguirem ser alvo dessa atenção, querem que reparem neles, disse-me um amigo respondendo às minhas perguntas sobre as razões da história do regresso de Sahe à vida.
Explica-me o amigo que, nos tempos da Resistência, eram muitos os grupos clandestinos espalhados pelo país, dos sítios mais recônditos de Timor-Leste, às vilas, aldeias ou mesmo em Díli.
Tantos eram e tão complexa era a rede que mal se conheciam entre si.
Entretanto, já no devir da independência, elementos de vários desses grupos foram reconhecidos como veteranos. Mas, porque clandestinos houve muitos e a luta pela Resistência envolveu a quase totalidade do povo timorense, uns quantos continuaram sendo ignorados.
Parece ser essa a razão da história ressuscitatória de Vicente Reis, uma história que tem alimentado as conversas dos timorenses. Para uns, tudo não passa de uma grande mentira de quem apenas quer extorquir dinheiro; defendem outros que, a par de Vicente ou Sahe, há muitos mortos–vivos e muitos isolados por esse país fora.
O grupo que apresentou em conferência de imprensa a foto do presumível Vicente ou Sahe ao lado de Xavier do Amaral é liderado por Rio da Montanha e denominado Conselho Executivo da Caixa Geral Nino (ou Ninho??) de Timor. E a denominação Caixa Geral diz respeito aos caixas/estafetas clandestinos encarregados de levar as mensagens aos guerrilheiros.
O grupo está descontente com o rumo dado ao sentido da sua luta e com os governantes timorenses. Para além disso, quer ser reconhecido pela sua intervenção na luta clandestina.
Mas, para se alcançar determinado objectivo, “vale tudo até tirar olhos”? Talvez não, mas conhecendo-se a apetência timorense pelo mistério e pelo poder do sobrenatural vale, com certeza, o recurso a histórias rocambolescas como esta...
Cada vez mais curiosa com o final da história, direi em jeito de conclusão como o meu amigo “ vamos esperar pelo dia 27!”

terça-feira, outubro 16, 2007 

Porque não imortais?

Sobre a história do morto-vivo, há versões para todos os gostos, umas mais verosímeis que outras, o que, uma vez mais demonstra a prodigiosa imaginação timorense, o gosto e o pendor para histórias fantásticas!
Xavier deixou-se fotografar com “Vicente Reis” mas a verdade é que, quando o fez, não tinha a certeza de que era realmente o Sahe, mal recordado das suas feições de jovem, sem os traços de envelhecimento que o homem da foto mostra, afirmou o próprio Xavier à comunicação social ao mesmo tempo que declarava que Vicente está vivo.
Marito Reis, um dos irmãos de Vicente, disse precisamente o contrário: Antes de morrer, Vicente cortara uma manta ao meio, ficando com metade e entregando a outra metade ao filho. No corpo entretanto encontrado, estava a metade da manta de Vicente.
Xanana Gusmão também já se pronunciou. E manisfestou-se contra os contadores destas histórias que apenas vêm alarmar o povo, sugeidno a prisão dos seus autores.
Diz um dos cépticos que o homem que quer ser (ou é) Vicente se chama Manuel, é de Aileu e fez a campanha eleitoral ao lado de Xavier. Vicente Reis está morto e a prova é que nas suas ossadas lhe falta um pé, cortado pelos indonésios que o mostraram como prova da sua morte.
Outro acrescenta que ele, o pseudo-Vicente se tem passeado em Díli desde sempre, onde é conhecido.
Mas também os há que acreditam que pode ser Sahe, até porque desde há muito tempo que se fala de um grupo de isolados nas montanhas. E por essa ordem de ideias se chega à conclusão de que David Alex e Mau Hodu também podem estar vivos.
Entretanto, está prometido que, no próximo dia 27, Vicente descerá das montanhas de Aileu e virá a Díli, pelo seu pé.
Recuando um bom bocado mais no tempo, antes ainda da ocupação indonésia, houve dois acidentes que alimentaram muitas histórias que perduram até hoje.
Não me recordo bem se terá sido na década de 50 ou no início dos anos 60 quando o avião quadrimotor de 16 lugares que dava uma nota de mediana riqueza à então província de Timor Português caiu no mar, a caminho de Darwin. Não houve sobreviventes e nunca foram encontrados destroços e, por isso, surgiram de imediato muitas dúvidas sobre a existência de acidente. O piloto continuava vivo!

Claro que nunca mais houve novo quadrimotor que Timor era longe de mais e mesmo sendo parte do Império, despender dinheiro em dois aviões bons para tão pequena província era demais!
As viagens aéreas – internas – passaram então a ser asseguradas por um aviãozito de oito lugares que, apesar de pequenino, em mau estado e com reparações à la minute feitas pelo Sr. Paquito Morato, ainda foi utilizado nas buscas ao navio Arbiru - que veio substituir o velhíssimo D. Aleixo - desaparecido logo no início dos anos 70, se me não falha a memória, em 1971.
Apanhado por violenta tempestade, o navio Arbiru desapareceu a caminho de Singapura ou Hong Kong. Houve um sobrevivente que - de acordo com o testemunho dado na época - se salvou por se ter agarrado a um pedaço de madeira. Do navio, nada. Do capitão e dos outros passageiros, nem sombra! Lembro-me ainda de alguém me ter contado que o sobrevivente ainda vira o capitão olhando o mar enfurecido enquanto fumava um cigarro bem aceso, à prova de água pela certa, já que, apesar da chuva que caía em grandes bátegas não se apagava!
Uns tempos depois, alguém contou ter sabido que o Arbiru estava atracado num porto asiático, pintado de novo. E os passageiros foram vistos numa ilhota próxima. Só que não podiam falar...
Nós, timorenses, aceitamos e convivemos bem com a morte, mas o morto, precisamos de o ver... para crer, como são Tomé. Porque, se pudermos permanecer vivos, ainda melhor! Morrer, morrer completamente não é connosco. Quando muito passamos para o lado de lá, e passamos a gozar de outra forma de vida. Numa gruta, na montanha, no fundo do mar, nu
ma ilhota, até mesmo numa sepultura, nas entranhas do Ramelau, pouco importa! Mantemo-nos vivos!
Mas, já agora, porque não passarmos a imortais?

sexta-feira, outubro 12, 2007 

O Morto-Vivo

Não tivesse eu visto na televisão e iria concluir que era só um dos murmurantes, secretos e tão normais com bem aceites rumores de Timor-Leste.
Não, desta vez, não era isso. Nem era a Pontiana. Nem sequer um buan*. Menos ainda uma ilusão dos sentidos.
O que vi, quase - quase! - me fez acreditar que um dia destes vou ver um porco com asas brancas a voar, a planar por cima do telhado da minha casa e a aterrar no aeroporto de Díli!
Eu explico.
Ouvi há dias uns zunzuns e não liguei. Mas hoje em vez de zunzum foi uma notícia na RTTL. A última reportagem do jornal da noite.
Um homem de meia idade, magro, com uma poupa à Elvis, olhar sério, penetrante, pousava numa foto ao lado de Xavier do Amaral. A RTTL mostra imagens de alguém de óculos escuros falando à multidão nos comícios da ASDT ao lado do líder desse partido e fundador da FRETILIN, Xavier do Amaral. Insinua mas nunca diz claramente quem é.
Ali em Béduku, para os lados da nascente da ribeira de Comoro onde se realizou a conferência de imprensa, a câmara foca a numerosa assistência ( que se diz ter vindo com Vicente) e de entre ela sobressai uma mulher limpando furtiva e teimosa lágrima caída enquanto escuta as palavras de um senhor também de meia-idade que explica qualquer coisa em tom ciciante que a RTTL não consegue captar bem.
E de repente a revelação: Vicente Reis, Sahe de seu nome de guerra, um dos activistas da FRETILIN “morto” em 1975 está vivo!
Diz-se que, para a próxima, Vicente sairá da foto e aparecerá de carne e osso. Porque se sabe que é preciso ver para crer. Como São Tomé. Porque também se diz que os ossos da sepultura que se cria ser de Vicente eram demasiado pequenos e não condizem com o seu tamanho. Para os menos crentes, soube-se mais tarde que alguém disse que Vicente está disposto a submeter-se a exames de ADN para acabar com possíveis desconfianças sobre a sua identidade.
Sendo tudo verdade, que a foto é de Vicente Reis e que este esteve até agora escondido nas montanhas com algumas surtidas à cidade mas sendo também Timor tão pequeno, toda a gente se conhecendo e todos sendo primos entre si, sendo os irmãos de Vicente personalidades de relevo na cena política timorense (José Reis é o vice-secretário geral da FRETILIN e Marito Reis um dos animadores da FRETILIN-Mudança e ambos são bem conhecidos não só em Baucau de onde são naturais como em todo o país), e ainda que tenham passado muitos anos sobre o ano de 1975 como se explica que ninguém o tenha visto antes ou que ninguém o tenha reconhecido?
E porquê o aparecimento de Sahe agora? E porquê o silêncio de Xavier do Amaral? E porquê o aparecimento de Xavier do Amaral naquele local de revelação? E porque não difundiu a RTTL as palavras de Xavier do Amaral? Haverá mais mortos-vivos? Quem?
Será verdade? Será encenação?
Estou curiosa por saber qual vai ser a reacção da FRETILIN e da família do morto-vivo! Até porque é fácil de adivinhar que, com Xavier do Amaral pelo meio, Vicente já não deve fazer parte do partido do qual é (ou era?) um dos heróis.
Quase apetece perguntar: que mais nos irá acontecer?

* buan - bruxo

quinta-feira, outubro 11, 2007 

Da rotina e da mulher sob o olhar de um montanhês

O orçamento passou às 3 horas da madugada de segunda-feira. Era tarde mas houve muita declaração de voto e o o dr. Alkatiri declarou que é melhor incluir no próximo orçamento a ser apresentado em Janeiro de 2008 uma rubrica destinada a eleições antecipadas. O julgamento dos elementos das F-FDTL envolvidos no massacre dos polícias continua. Os passeios de Díli estão a ser todos arranjados; as ruas da capital diminuiram de largura e continuam a transformar-se num imenso mercado. Defronte das casas onde morre alguém as vias públicas são fechadas ao trânsito e todos achamos normal. No espaço defronte da Igreja de Motael pastam vacas o que também já uma vulgaridade. Os cabritos e os porcos passeiam-se alegremente pela cidade que é deles e ninguém acha anormal. Os cães de vários quarteirões ladram furiosamente noite adentro, deixando adivinhar movimentação estranha na zona o que também não é nenhuma originalidade. E eu escrevo sobre a Mulher aos olhos de um montanhês do sopé do Ramelau.

***

Dois amigos da montanha defendem convictamente que o barlake dignifica a mulher cuja posição na sociedade timorense é de suma importância, dizendo ainda que o problema da má compreensão dos costumes se deve ao facto de em Díli ser tudo muito superficial e se desvirtuar o sentido das coisas transformando em verdade o que não o é realmente.
É que “vocês em Díli deixam-se convencer facilmente, não analisam bem as coisas!”, criticam.
Na montanha, dizem, é que as tradições e os costumes “valem e continuam
como no tempo dos nossos avós”.
Há natural divergência de opiniões, discute-se muito, usam-se diversos argumentos, ninguém se deixa convencer por ninguém mas aprende-se sempre muita coisa.
Perguntou-me o Henrique Corte-Real se noutros países alguém se referia à mulher
como a “Feto-Maromak”, Mulher-Divindade, Mulher-Deusa.
E porque nunca de tal tinha ouvido falar, o Henrique dispôs-se a explicar-me que “Deus criou o homem e a mulher. Eva saiu da costela de Adão que foi criado por Deus. Mas, a partir de então, o homem e a mulher nascem da mulher. É ela que lhes dá Vida. A mulher é a fonte da Vida. Depois de Deus, ela é a criadora do homem e da mulher, do ser humano. Por isso lhe chamamos Mulher-Deusa”.


domingo, outubro 07, 2007 

Sábia velhice!

O meu amigo Tomás, um senhor sábio “ainda não muito idoso” , como gosta de frisar, e falante de bom português é um excelente contador de histórias. Há dias presenteou-me com esta:


Josué, o filho mais velho radicado há uns anos na cidade, atravessou montanhas e vales e, ao fim de um dia de viagem, já muito cansado, estirou-se no lantém da casa de palapa do seu velho pai. Construída num socalco, ladeada de arequeiras, buganvílias e ibiscos e um pequeno jardinzito minúsculo cheio de cravos da Índia amarelos a contrastar com o azul do céu, a casa do pai era o refúgio ideal para quem quisesse “estar mais perto de Deus”.
Bebeu um café, mordiscou um pedaço de talas cozido ao qual juntou uma nico de piri-piri e olhou o pai de soslaio, ao mesmo que lançava um longo suspiro de quem não sabe como começar…
A mensagem não era muito fácil de transmitir e ele conhecia o carácter do pai… Mas, precisamente porque o tema era algo incómodo, havia que passar depressa a mensagem e assim acabar com a inquietação que a mesma lhe provocava.
Magro, de olhar profundo, com a serenidade habitual nos velhos sábios da montanha, de quem tem muito tempo para pensar e meditar nas coisas da Vida e dos homens, o velho pai esquadrinhou cuidadosamente o rosto do filho procurando-lhe os olhos, desconfiado de que ali havia coisa!
E a “ coisa” soltou-se mais depressa do que esperava:
- Oh, Pai. Como sabe eu fui baptizado no ano passado. Eu estou muito satisfeito, pai! Mandaram-me cá ter consigo para lhe dizer que teriam muito gosto em fazer de si um das ovelhas do rebanho. O pai tem de ser baptizado!
O velho pai imprimiu invulgar rapidez à arte de mastigação da masca, arremessou vermelha cuspidela para bem longe, tossicou para aclarar a voz e sentenciou:
- Olha, filho, fico muito satisfeito que te sintas bem na tua nova condição. Vai dizer aos teus amigos que agradeço muito a atenção. Mas aproveita para lhes lembrar que o Pai do Filho também não foi baptizado! Portanto, porque hei-de eu desobedecer à lei Divina?

 

Há nuvens no horizonte.

Vivemos uma paz podre.
A cada momento, quando menos se espera e, uma vez mais sabendo-se lá por que razões, surgem incidentes.
O barulho provocado pelo rebentamento de engenhos explosivos na noite de quinta-feira nas instalações da Cooperação e Defesa das forças australianas,
ecoou por toda a cidade e as versões sobre a explosão multiplicam-se cada uma delas mais imaginativa que a outra. Afinal, foram ou não granadas? É verdade que morreu um australiano? Que um tanque de guerra ficou destruído? Atiraram da rua o engenho ou a explosão teve origem dentro do espaço militar australiano? Perguntas e mais perguntas sem resposta. Certeza, é que há alguém interessado em manter a situação de insegurança em Timor-Leste.
Hoje, como há um ano, a questão mantém-se: quem ganha com a instabilidade? A quem serve a manutenção deste estado de coisas em Timor-Leste?
E hoje como há um ano continuamos sem respostas.

quarta-feira, outubro 03, 2007 

Dos atalhos da Justiça

A avaliar pelo verde-escuro da folhagem que lhe servia de fundo, Reinado não teve de descer da montanha para conceder a longa entrevista à RTTL na qual não foi apresentado como major. Voltou agora a ser capitão-tenente da Marinha e assim foi tratado pelo entrevistador mal começou a conversa.
Rodeado de homens bem armados, o ex-major-capitão-tenente Alfredo Reinado usou de tom agreste para dizer de sua justiça que não se apresentará a julgamento se os juízes forem da “Mafia” da CPLP. Para além de que, não tendo feito mal nenhum aos “malais”, não terá de ser julgado por eles. E, enquanto espera pelos juízes timorenses, o ex-major-capitão-tenente lá foi dizendo que apenas responderá pela troca de tiros de 23 de Maio ocorrido em Fatu-Ahi, incidente do qual resultou a morte de pelo menos um elemento das F-FDTL. Quanto aos incidentes de 24 e 25 de Maio de 2006 nos quais também houve mortes, haverá outros que não ele a terem de ser responsabilizados, sustentou.
Reinado também quer o “acantonamento” dos seus homens - não, não há confusão, não há FALINTIL sem FDTL e não estamos em 1999! - não para serem capturados, mas porque o ex-major-capitão-tenente preconiza o seu regresso às Forças Armadas. Como e quando? Vá lá saber-se!
Ainda a entrevista de Reinado estava a ser digerida e logo nos surge outra notícia: Railós fora detido pela UNPOL na madrugada de hoje juntamente com outros elementos pelo seu envolvimento directo no incidente de 24 de Maio de 2006 em Taci-Tolu. A família não gostou porque entende que Railós não fez nada que justificasse a detenção. E a família, essa, sim, desceu a Díli e foi ao Parlamento apresentar as suas reclamações.
Pelo meio, falaram o Presidente do Tribunal de Recurso e o Procurador-Geral da República: os tribunais limitam-se a aplicar a lei e a fazer Justiça, ficando a política com os políticos (disse o juiz Cláudio Ximenes) e a presença dos juízes-CPLP é legal, considerou Longuinhos Monteiro.
No Tribunal de Díli prossegue o julgamento dos elementos da F-FDTL que atiraram contra os indefesos agentes da PNTL a 25 de Maio do ano passado. Uma testemunha, agente da PNTL, declarou ter reconhecido o autor dos disparos num dos onze militares a serem julgados, enquanto outra – uma mulher-polícia - afiança que os tiros partiram dos grupo das F-FDTL. Só que não consegue identificar os autores.
Talvez pela sua complexidade, talvez também porque, os temas acima tratados de tão densos, são “demasiada areia para a minha camioneta” ou até pelo adiantado da hora, assim como quem não quer a coisa, soltou-se-me o pensamento, voou, saltitou e quedou-se na matéria do meu estudo de hoje: os fins das penas e a culpa.

E por aqui me fico!

terça-feira, outubro 02, 2007 

Estou de volta!

Sexta-feira fui ao concerto da Sandra Pires, a timorense que saíu de Timor em 1975, viveu em Portugal e na Austrália, triunfou na Áustria e canta em português, inglês, alemão e tétum!
Numa tarde calma, de brisa leve e morna, as bancadas do Estádio Nacional encheram-se de jovens que escutavam atentamente, em silêncio, a cantora visivelmente “feliz por ter regressado às raízes.”
“Ela venceu na Europa!”, diziam repetidamente Hélder e Paula, os apresentadores.
No sábado, ao espectáculo de beneficência no Hotel Timor assistiu outro público, mais selecto. Depois do jantar com gastronomia timorense servido por empregados vestidos a rigor, cada um com o tais da sua terra de origem, na sala repleta muitos estrangeiros mas menos timorenses do que se esperava deixaram-se encantar pela voz de Sandra Pires.
Não estávamos muitos timorenses, mas nem por isso deixámos de a aplaudir ruidosa e vibrantemente, especialmente quando Sandra Pires nos presenteou com “Hau hakerek surat ida”, uma canção timorense igualmente cantada em várias ilhas do Pacífico-Indíco.
Fez-nos bem ao ego. É sempre compensador constatar que há timorenses vencedores, reconhecidos pelo seu talento, pelo seu valor profissional. Claro que gostaríamos que fossem mais, que não precisassem de sair do país para triunfar. Até ao dia em que assim for, fica a afirmação de um jovem no final do concerto do estádio “Ita mos bele!”, nós também somos capazes!

***

Há dias, alguém me chamou a atenção para alguns comentários num outro blogue sobre a minha colaboração neste blogue do jornal Público.
Não gosto de dar resposta ao que se escreve, especialmente quando não vejo a “cara” do meu interlocutor ou não reconheço o nome de quem está do outro lado. É sempre uma luta desigual.
Só que, desta vez não quero deixar sem resposta o/a comentador/a e por isso, peço licença ao jornal Público para, neste espaço, prestar o devido esclarecimento pelo respeito e consideração que me merecem o jornal e os leitores.
E é assim que vos digo que não aufiro nenhum vencimento nem isso faria qualquer sentido. Fui convidada para colaborar no blogue pelo José Vítor Malheiros, Director do Público Online, ainda a crise de 2006 ia no início.
Sinto particular orgulho por ter integrado os quadros do Público desde a data da sua fundação. Em Janeiro de 2002, e uma vez que regressava a Timor, deixei o jornal. Hoje, não sou funcionária do Público. E, como se calculará, seria impensável que não mantivesse com o jornal onde trabalhei durante 13 anos uma relação de profunda amizade o que passa, logicamente, pela minha disponibilidade para escrever sobre Timor.
Sempre que tenho disponibilidade, escrevo o melhor que sei. Sem qualquer veleidade de agradar a todos. Transmito o que vejo, o que oiço, o que sinto e como vivo Timor. É o meu olhar, obviamente. Mas faço-o com honestidade, verdade e respeito. E escreverei aqui enquanto puder e enquanto o Público quiser.