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sexta-feira, julho 28, 2006 

Nostalgia de Timor

A vida em Timor torna-se por vezes fastidiosa pela rotina dos seus dias. Pelo menos, era disso que se queixavam muitos dos que aqui viviam por algum período.
Repetiam-se dia após dia, anos a fio, os hábitos simples dos timorenses, esse povo andarilho que gostava de andar de um lado para o outro, sem destino, sem objectivo definido, apenas só pelo prazer de calcorrear atalhos, atravessar ribeiros, transpor colinas, montanhas inóspitas, quase sempre acompanhado do galo transportado cuidadosamente ao colo; gente que vai agora ao mercado vender uns legumes que trouxe da montanha e que lhe vai proporcionar, com sorte, uma refeição quente de supermim, aquela massa instantânea, saborosa, atribuída também como alcunha aos licenciados no tempo da Indonésia –os sarjana surpemim - pelo anterior PM. Gente da montanha que fazia música com uma garrafa na qual o tilintar de um garfo adquiria os acordes melódicos de valsa, tangos ou marchas - conforme a imaginação de cada um - e fazia as delícias dos populares que dançavam ao ritmo da garrafa depois até do último canto do galo. Gente que conversava à sombra do tamarindeiro, mascando, cuspindo vermelho, arrumando a bola de bétel, cal e areca num canto da boca para mais tarde saborear; pessoas que iam ao cemitério em saudosa romagem sem se esquecer de levar um pedaço de tabaco colocado cuidadosamente num canto resguardado para satisfazer os desejos de quem partira!
O tempo tinha outra dimensão. Os dias eram de ramerrão, num repetitivo nasce o sol, põe o sol, chove, não chove, semeia, colhe, anda, pára… De vez em quando um core-metan, um estilo, um casamento, traziam alguma novidade aos dias sempre iguais de Timor.
A novidade para o homem que havia chegado do interior podia ser o mar imenso que se estendia perante os seus olhos cheios de verde escuro-claro da sua montanha… homem perdido em deliciada contemplação do mar azul que via pela primeira vez …
Hoje, tudo está diferente. Estamos confinados às zonas de segurança. Não sei se ainda haverá quem acredite na existência de um pedaço de terra segura neste Timor-Leste onde se dão, se escondem e se entregam armas de uma forma tão banal, como se fosse um acto de rotina e de normalidade possuir armas para o que infelizmente já é considerado um desígnio comum e interiorizado, o de matar. Estou a falar de matar o outro, o próximo, o ser humano.
A angústia toma o lugar da nostalgia. Antes, porém, sobra-me ainda uma réstia de tempo para vos dizer que preferia os dias sempre iguais de antigamente!