« Página inicial | O que há aqui é uma grande falta de educação » | Chuva da manga » | Díli, destino-aventura » | Mas, as crianças, Senhor... » | Que vai ser de Timor-Leste? » | Decepções » | O Presidente falou! » | Ai, Timor Lorosa´e! » | Mistura explosiva » | Dormir? Não, obrigado! » 

quarta-feira, junho 28, 2006 

Apelo à paz em Timor-Leste


Há dias escrevi que Timor-Leste continua a suscitar muitas paixões.
Não sei se será correcto dizer que há paixões boas e más, umas oportunas, outras despropositadas. Mas tenho a certeza de que posso afirmar que algumas paixões de tão serôdias passaram o prazo de validade! Sem questões de Leste-Oeste, sem Muro de Berlim, em plena era da tão propalada globalização, deixou de fazer qualquer sentido a colocação num ou noutro lado da barricada capitalista, imperialista ou comunista! Chega!
Em Timor-Leste vivem-se dias problemáticos. Está a ser complicado, quase impossível, segurar quem se manifesta a favor e contra o Governo.
Os timorenses têm perfeita consciência de que se aproximam tempos difíceis e, recordando palavras do Primeiro-Ministro demissionário proferidas há dias a um jornal português, estamos perante a iminência de uma guerra civil.
Recuso-me a acreditar que haja um timorense interessado que timorenses matem outros timorenses em nome de paixões partidárias, de interesses individuais ou de, simplesmente, de irreflectida tomada de posições.
Se houver guerra, ela não aproveitará a ninguém.
Não podemos consentir que Timor-Leste acabe como país e passe a território desertificado de seres humanos, timorenses, apenas porque há um vencedor; quando um grupo vencer outro nesta luta estúpida e desnecessária, poderá não haver ninguém para contar. Não vai haver vencedor. Seremos todos um país vencido pelo ódio, dizimado e, sem povo, passaremos a nação inexistente.
Ninguém ignora que os timorenses são excessivos em todos os seus actos. Todos temos consciência de que nos empenhamos para defender apaixonadamente - e por vezes de forma ilógica - aquilo em que acreditamos. Está a ser difícil gerir as nossas paixões. Todos nós, timorenses, temos a percepção de que se está a perder o controlo sobre os milhares de manifestantes que, de um e de outro lado, não estão dispostos a ceder.
Sou timorense. Não quero uma guerra. Não quero o fim de Timor-leste. Não defendo que o meu país se resuma a um protectorado de uma qualquer potência estrangeira, seja ele país ou organização. Não, eu defendo Timor-Leste, nação, país, onde haja democracia, paz, segurança, tolerância. E respeito! E timorenses, vivos!
Ao mesmo tempo que nos debatemos com a premência de refrear os ânimos de populações que, de uma ou de outra forma, foram já vítimas do conflito, desenrolam-se, em paralelo, outros debates em instâncias mais sofisticadas nas quais se dão voz às paixões exacerbadas pelas facções em conflito. Esgrimem-se as virtudes e os defeitos dos timorenses, dos partidos, de outras forças em presença. Faz-se descarada apologia do que momentaneamente serve determinados interesses grupais, com total desrespeito pelo povo timorense em nome de quem todos dizem falar. De forma paternalista, de quem vem do Mundo civilizado, opinam, insultam e invectivam, contribuindo, ainda que de forma indirecta, para a radicalização de posições.
E os timorenses ouvem, lêem, vêem. Não seremos muito “inteligentes”, seremos talvez um pouco “burros”, como, aliás, alguns já disseram. Somos do Terceiro Mundo. Depauperados, dependentes, impreparados. Mas estamos atentos e somos bons observadores.
Tudo nos faz recordar o ano de 1975, quando um grupo estrangeiro decidiu tomar partido em Timor contra outra corrente partidária. O resultado foi o que se viu. Uma guerra civil, uma invasão e posterior ocupação estrangeira, 24 anos de sofrimento. Milhares de mortos. Estrangeiros? Não! Timorenses, porque os estrangeiros findos os ensinamentos, regressaram sãos e salvos ao seu país.
Culpados? Os timorenses, pois claro, pela inexperiência, pela imaturidade, pela impreparação…
Hoje, assistimos a discussões apaixonadas de apaixonados delirantes de alguns estrangeiros de diversos países. Os timorenses são a bola atirada ora para um lado, ora para o outro. Uns e outros estrangeiros, convém que se diga, defendem as cores dos seus interesses, embora o façam sempre em nome de Timor-leste!
Uns estão cá de motu próprio. Outros assessoram o governo de Timor-Leste, e, se bem me parece, esses assessores estrangeiros podem e devem aconselhá-lo. Outros ainda vêm em regime de cooperação. No âmbito puramente institucional devem aconselhar, opinar. Mas impõe-se que, fora do seu trabalho, todos o façam em círculo restrito, entre amigos.
Adivinho possíveis reacções desagradadas de estrangeiros sobre o direito que lhes assiste de emitir opinião. Esclareço que este desabafo, obviamente, apenas se dirige a quem escusadamente se imiscui na vida política de Timor-Leste nas questões internas deste país.
Não sou xenófoba nem racista. Nem faria sentido que assim fosse, porque assumo convictamente a minha dupla nacionalidade luso-timorense e de mestiça, filha de pai português do Algarve e de mãe firaku, de Venilale, no distrito de Baucau, em Lorosae. Acrescento que nasci no distrito de Liquiçá, no que hoje se designa por um dos dez distritos de Loromonu.
É justamente em nome da minha cidadania timorense que faço nesta página um apelo aos estrangeiros que, aqui se encontrando temporariamente, aqui trabalhando, vão debitando opiniões de índole diversa sobre o nosso destino enquanto país.
A situação é crítica. Enquanto timorenses temos a obrigação de envidar todos os esforços e canalizarmos as nossas paixões para o bem comum, que abranja todo o povo de Timor-Leste.
Agradecemos a presença de estrangeiros em Timor-Leste para nos transmitirem os seus conhecimentos, know how, do qual o país – deixado ao abandono pelo poder colonial, saqueado e humilhado pela potência ocupante -obviamente beneficiará!
Mas dispensamos que, em nosso nome, venham deitar mais achas para a fogueira!
Deixem-nos, por amor de Deus, com a tranquilidade possível, resolver o intrincado problema com que nos debatemos! Deixem-nos limar as arestas e apartar o que nos desune! Guardem as vossas paixões. Guardem as vossas energias para as lutas partidárias nos vossos países de origem onde há paz e estabilidade!
Aqui perdemos a paz! Não temos estabilidade. Corremos o risco de perder definitivamente a nossa soberania. Não contribuam para mais divisionismo! A hora é de contenção.
Dispensa-se o desfraldar de bandeiras!
É hora de vos dizer basta!
Pela unidade. Pela independência. Pela Vida. Pela paz. Pelo futuro de Timor-Leste! E esse tem de nos pertencer por inteiro!

REFª.:"(...)que posso afirmar que algumas paixões de tão serôdias passaram o prazo de validade!(...)"
_________________________________

Sra.Jornalista Ângela Carrascalão:
Hà sempre algo - por mais inteligentes que sejamos - que nos trai, mesmo ao escrevermos. Subliminarmente fica quase explícita a ideia de que a FRETILIN se poderá incluir numa das daquelas paixões serôdias a que alude no seu post. E daí resultar que sejemos levados a pensar mal deste partido.
Lembre-se no entanto que ainda mais serôdia que a ideologia marxista é certamente a capitalista, a feudalista, e a esclavagista.
Com segurança (o processo histórico não pára) o capitalismo há-de dar lugar a outra nova ou coexistente ideologia...

Sou um seu leitor assíduo, que a respeita enquanto jornalista séria, e, talvez por isso, me permiti postar estas linhas.

Sr. Zé Lérias,

Agradeço o seu comentário mas não me refiro, de certeza, às paixões dos timorenses.
Mau seria que classificasse de serôdias as paixões de um partido timorense!
Pior seria ainda que qualquer partido não defendesse com paixão os seus princípios!
Péssimo seria que não houvesse respeito entre os partidos políticos timorenses.
Se quero ser respeitada, tenho de respeitar os outros...

Concordo que todos os povos querem ser independentes.Mas existem territórios que serão sempre artificialmente indpendentes, o caso de Timor.Que estará sempre sujeito a ventos e marés.Encaro Timor como um Concelho em ponto grande.Um presidente da camara e varios vereadores.Com tristeza digo que estará condenado este territorio e andará sempre dependente das 'boas vontades' de outros paises.

Peço ao Publico se possível, para publicar aqui o “polémico” discurso do sr Alkatiri.
Desde já os meus agradecimentos.

Enviar um comentário